sábado, 25 de agosto de 2007

Chaveirinho,

De repente ficou tudo um pouco menor.
Viver é tão estranho, menina. Numa hipocrisia tremenda, nos rendemos a preceitos esdrúxulos, a rótulos dos quais sempre juramos que fugiríamos... vivemos tanto essa hipocrisia, que qualquer possível pedido de ajuda parece distante e não é. Foi tudo por tanto tempo uma super estimação de mim e de ti, que se você pediu ajuda em silêncio num momento ou outro não ouvi. Juro, se soubesse que chegaria a esse ponto, eu teria crescido primeiro só pra tentar te mostrar o caminho e deixá-lo mais iluminado. Eu o teria enfeitado de estrela e de flor. Mas foi tão bonito crescer junto contigo, menina... tão bonito, e agora, apesar de alcançar meu paraíso cada dia mais e aos poucos, morre parte de mim ao te ver estagnada no meio do caminho, já escuro. Sai daí. Sei que você pode, não teria cedido minha alma e minhas crenças a ti em quase todo momento de nossa vida caso não acreditasse na tua força.
E morre parte de mim vendo você dopada desses remédios. Queria estapear teus pais e te carregar no bolso pra todo canto, menina. Não posso por ainda ser minúscula demais. Arriscar tudo agora seria correr o risco de parar no meio da estrada com você, todavia tenho de continuar e é por nós duas. Porque se morro vendo você se dissolver aos pouquinhos, quero viver sempre que você sorri. E eu quis viver quando me dissera que não terminou o corte por não querer me deixar. Não me deixa, menina. Não me deixa, viver sem te ter no final do espetáculo aplaudindo de pé seria jogar uma existência no lixo. Não me deixa, não posso viver pela metade só por você jamais ter acreditado na tua luz. E como brilha, meu deus. Entrou pro meu mundo tão quieta, tão monossilábica, apreensiva... agora é cada letra de verso na parede, é cada hora em que volto a ser criança, é cada hora que não deixei de ser.
Como brilha a menina que me permitiu ser, entendeu e foi também. Não me deixa, pequena. A gente nem sequer tirou uma foto bonita juntas ainda, lembra? A gente ainda não virou mochileira, não comemorou aniversário dançando a noite inteira, não foi andar a cavalo na fazenda da tua . A gente ainda não envelheceu por fora.
Pega aqui o que sobrou p'reu fazer por ti. Vem cá, pequena, revira aqui dentro: você é mais atenta e ainda deve ter algo lá. Me ajuda a encontrar, agarra e leva embora - quem sabe algumas margaridas não brotam no caminho?
Sai desse quarto e abre a janela. Estende os braços pro teu passado e pro que construímos - vai, menina, vai ficar arrepiada de si própria. Dá pra mim algo a oferecer além do colo e do tapa. Meu amor é maior que isso, ele abraça cada partícula no espaço sentimental entre consolar e bater. Imenso. O espaço, o amor. Não me deixa, vai dormir e devolve meu sono só hoje.
Tranca esses comprimidos na gaveta. Toma as lembranças doces e os sonhos no lugar. Toma as frases daqueles filmes, os trechos de livro e as nossas lágrimas derramadas de esperança, menina. Eles alucinam, só que é pra te fazer cintilar pelo caminho.
E enxergar as margaridas...

terça-feira, 14 de agosto de 2007

Filosofia

Ela observava. Havia quem dissesse que se cruzaram antes e, olha, era verdade. Mas tinha vergonha: a bailarina, naquela manhã de maio, de aparência um pouco pior devido à noite mal dormida de ansiedade, estava desesperada demais querendo ser compreendida. E, como sempre, ela se rendeu ao primeiro revelado como um pouco mais profundo que os outros e os esqueceu - tanto aqueles de fato superficiais, quanto quem poderia tê-la compreendido caso tivesse sido visto. Acontece que o frio os havia tornado transparentes.
Sofia não dançava. Ou pelo menos não admitia. Nem sequer era adepta daquela idéia maluca de o mundo ser um palco e a existência, uma improvisação teatral absurda na qual uns momentos de glória aqui e acolá dão o clímax e o sentido completo. Sofia era tão diferente! A bailarina ainda era muito perdida quando soube a razão, sentindo-se, inclusive, menor. Havia nessa diferença uma praticidade recheada de personalidade e boas ações. Era isso! Sofia não era poeta: era a ação sobre a qual se escreveria, sobre a qual se pensaria e seria, enfim, admirada e guardada como esperança. E tudo isso de uma forma mais presente que o mundo ao redor.
Ela observava. E já fazia tempo! Entre nada mais que monossílabos, "oi, tudo bem?!" e um desejo verdadeiro que de estivessem sim, foi desejando e desejando até Sofia virar também parte da música que dançava.

[Continua. Eu acho.]

Impossível de catorze dias

Estou me dando conta agora. Picada e fora de ordem, até conseguir fundir o palpável com a bagunça aqui dentro: Moça, você estava namorando uma Possibilidade e há que ser certeza, nem que por um segundo.
Doeu demais ficar alheia a nós e poder ver que o "Sim, namoro você" era uma manifestação delicada de não-saber extremo. E era, Possibilidade. O amor de Túlio deixou de ser meu e não sabia direito o que fazer com isso, sendo tão mais perdida aí, que encarei você - primeiro humano desconhecido caído na minha tarde de junho - como se fosse um tipo de dádiva do contexto. E não era, Possibilidade... era apenas você.
Quis me desculpar, como quis. Todavia, no alheamento só de mim vi tuas chances e tua indiferença e, sabe, teríamos de ter passado por ele ao mesmo tempo. Não passamos. Ainda que estivesse você num estado de lucidez maior.
Conheça-te, Possibilidade, que envolver a alma dos outros em nós mesmos só vale a pena se for leve e se for livre. Quis então que, sim, você fosse feliz... e se me perguntassem o porque do término, diria sem excitação alguma ter sido por esse meu querer de te ver feliz além de independente, ser longínquo. Não nos enganemos de novo... Não quis envolver tua alma e mim hora nenhuma e você sentia. Deixou de lado por reconhecer que era possibilidade e só e, meu deus, a intensidade com que viramos súditos da Chance me derrubou e parei de querer te olhar nos olhos...
Longínqua e independente - e eu não podia mais.

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

Don't know why

E era apenas uma menina quando ele ficou hipnotizado por seu sorriso pela primeira vez. Estavam os dois sentados naquele banco por que ela sempre passa, um de frente para o outro. Não se sabe ao certo, mas parece que sim, havia estrelas no céu e fazia um pouco de frio... e a garota pôde ignorar qualquer possível desconforto físico para olhá-lo nos olhos e tentar se espremer dentro. Conseguiu: estavam personificadas no sorriso as milhares de afinidades que iam se mesclando aos poucos para cobrir os buracos do passado e da vergonha deles. E cobriram até a manhã seguinte.
O coração na boca a fazia ponto de interrogação de uma maneira como jamais esteve, e até fez com que brotasse nela uma santidade quase mantida em segredo. Blogger: verdadeira solidão - Criar postagem
Desculpa, moço. A santidade dela são se manteve censurada porque queria dá-la a você a qualquer preço. Desde o dia em que as metáforas foram brincar de esconde-esconde e o Amor escorregou cru te espancando doce, ela só queria te deixar saber que te daria a mão esquerda e com a direita carregaria todos os teus medos, gritando silenciosa "Ei, você pode ser o que quiser!"
Foi sendo menina e só até os braços saírem pelas janelas do quarto e as pernas praticamente serem amassadas enquanto amontoavam-se nas portas, também afogada por toda história de vida flutuante no cômodo com velocidade da luz. Não era extensa, mas atingia tão diretamente e várias vezes que agora inexistia um espaço físico que comportasse a garota, as interrogações e o volume de sua santidade frustrada (este, sim, era astronômico).
Ali a única indagação palpável era como, pelos deuses, o quarto ficara minúsculo se os olhos dele a enxergavam cada vez mais nítida e até sentiam-na, dependendo da sobriedade dos dois. Foi quando se deu conta de estar começando a viver a complexidade no seu auge, por ser alheia. E viveu, meu bem. Viveu carregando com a mão direita e esquerda grudadas, num equilíbrio que por vezes pareceu não se suportar e superou a si mesmo, por fim. Atualmente habita a compaixão dela e é inquebrável.
My heart is dressed in wine...
"
Tem sido assim pra você viver mais". Ia repetindo e repetindo baixinho sempre que cada "olá" trocado com ele provocava dor.
But you'll be on my mind forever...
As cartas não-entregues poluindo o caderno de Matemática não mentem... se dói é porque é bonito e ela pede pra não te preocupar não, moço, que amando a dor também é doce e não se estende a ti.