Ninguém tinha cabelos crespos, não que eu me lembre. Nem eram ruivos. Não havia nenhuma gorda, baixa e sardenta. A não ser dentro de cada um. Sabia disso.
Sobre as histórias devoradas, não sei de onde vinham. Talvez de minutos emprestados de quem só as contava porque tinha que contar. Mas prevaleceram.
O que eu implorava era que alguém por perto também respirasse aquilo tudo... acho que sempre quis ser compreendida pela realidade e o que me alcançou foi o contrário. E era tão estranho o quanto eu estava ocupada demais, respirando, a ponto de realmente não ligar para isso.
Um dia eu acordei e pareceu que não só o talento para a crueldade, mas também o silêncio e a apatia já haviam invadido. E mais que nunca eles eram cadáveres, eram corpos sem vida com alma eterna. É isso, o silêncio, a crueldade e apatia invadiram a alma deles, que nem lutaram.
De fato, não sei se apatia em algum momento impõe algum anseio, algum desejo. Só que parecia tanto que esse desejo era a necessidade do meu sofrimento, que eu aceitei.
Ainda não sei bem que horas eram quando comecei a viver, porque o tempo sempre foi indefinido. Quem sabe eram eles que o controlavam? Eu só lembro que foi quando comecei a me sentir. Daí todas aquelas explosões, que fossem por nada, não importa, souberam virar coisas bonitas. Foi quando elas começaram a fazer sentido, não quando eles começaram a compreender. Isso nunca aconteceu. Foi quando isso deixou de fazer falta.
Aquelas histórias viraram liberdade, guerras de balão d'água e esperança de alegria. E eu fiquei estonteada quando soube. Segurei com tanta força e, por vezes, iludi a mim mesma como se não existissem só para sorrir depois, quando me lembrasse que existiam sim. Se Ela foi clandestina não é mais, porque eu pude tocá-la. Pressentia que um dia tocaria e esse pressentimento me fez viver no ar. Desde sempre.
Quandoa colocava diante de mim não era mais uma menina em êxtase.
Era uma mulher com seu amante, pelo tempo que quisesse.