sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Para Vinícius.

Cultivo certo apresso por quem eu pude sentir um amor leve daqueles. “Aqueles”, bem, eu digo daqueles amores que não esperam muito, os que repousam na idéia de que casar, ter uns dois filhos e uma casa grande bastam para uma felicidade genuína, não sendo apenas uma forma de desviar os olhos do vazio do mundo e se esquecer dele.

Sei que te amei assim, sei que você me chamou pra morar com você um dia, e eu tinha só quinze anos e na época me soou como aceitar um destino que me fizesse fundir com Deus - e ainda lembro da dor de quando você sumiu.

Agora, quatro anos depois, sei a razão. Sendo tola e altamente idealista (eis aqui um pleonasmo sutil, mas perigoso), você foi apenas um dos vários casos em que o destino que se cumpriu não, não foi o de eu ser esposa, e sim o de me apaixonar continuamente por homossexuais.

Que seja cômico, como de fato é. Por vezes, se refugiar em fantasias é consideravelmente a primeira e mais feliz escolha, em relação a se submeter a clichês da sabedoria popular. Neste caso, o de que homens não prestam – porque não mesmo. Vivi todos esses amores irreais sozinha, fato que me tornou bastante introspectiva e pouco falante – minha glória sempre foi não verbal e assim sigo dançando. Mas juro usar essa característica da melhor maneira que consigo agora, para meu deleite: para saber olhar, e por vezes até ser tomada, erroneamente, como sábia. Juro então também que não há mágoa nenhuma, só alguma nostalgia e, de consequência, a característica de saber contemplar uma boa ironia – isso sim é essencial para se viver. Obrigada.

De certa forma, gosto que a vida insista em me colocar nos bastidores de alguns momentos da sua vida. Numa capital de mais de milhões de habitantes continuamente estou em algum lugar em que você está, e sendo invisível de corte de cabelo novo e pela própria vontade de ser invisível e pela vergonha, me mantenho lá, nos bastidores. Assisto alguns segundos da cena e volto para casa pensando em você. Um dia não aguentei, te escrevi e estamos bem, estamos perdoados. Mas ainda distantes.

Saiba, fica comigo a vontade de sair dos bastidores, você seria plateia e eu faria um solo peculiar. Pois que contando num ato só os fatos passados em quatro anos, transitaria por todas as emoções possíveis... se bem que tenho ensaiado tanto, que poderia contar num gesto, e te fazer sentir comigo um êxtase de totalidade na experimentação de Tudo (veja que você me deixa a possibilidade de me fundir com Deus pela segunda vez na vida).

Você sumiu, meu cachorro morreu, tudo tão triste, fim de ano, 2006, descobri filosofia, me apaixonei por professor, fui gorda feinha, em 2007 fui semi-deus por mérito, paz que durou, dançar a vida inteira num ano, vestibular, passei, veio filosofia de gente grande, morar sozinha, 18 anos, depressão, quase voltei pra trás, aprendi francês, ganhei gatinho, veio primeiro namorado adulto, gente adulta é muito chata e ele passou, veio pesquisa, salário, 2009, grego e cabelo cor-de rosa, veio amor de verdade daqueles que matam, traição, tentativa de esquecer, flamenco, sair do palco e acabar dormindo com moço mais velho, 2010, volta do amor de antes e seu triunfo, que ainda está, meus 20 anos e a briga com a melhor amiga – essa não voltou. a desilusão com a arte, mas a glória de me afetar cada vez menos com a efemeridade e fragilidade do mundo dos homens.

Me pego nessa véspera de natal querendo contar que sonhei contigo há uns dias. Você pulava do quinto andar, você caía, você morria e não voava e não era anjo, como aos 15 anos tinha certeza que você era.

Se você me deixasse dançar, se você assistisse, se você voltasse, haveria momentos de quedas com toda graça no palco, quedas não decisivas, você as aprenderia. Eu poderia até pedir depois “Vini, cai bonito”, e você conseguiria e eu saberia: Sim, suas quedas são exemplares.

Volta pra eu poder sonhar tranquilo...

3 comentários:

Nilson Barcelli disse...

Nathália, fiquei impressionado com este teu texto. Terá sido a vez que mais abriste a tua alma, que é linda. Resumiste vários aspectos marcantes de 5 anos da tua vida, numa sucessão de confissões relativamente íntimas. És mesmo assim, contigo nunca há blá-blá-blá...
Nathália, querida amiga, desejo-te um excelente 2011.
Beijos.

JULIANA disse...

Oi Nathalia,
vou fazer um post no blog pra te responder tá bom!
Bjs

Verbena Cartaxo disse...

ei querida minha, como vai você?
estou de volta a bh, cheia de vontade de colocar a fabriqueta de bolinhos na ativa outra vez.

continue sonhando daí
continuo sonhando daqui.

nos vemos em breve,
to ansiosa pelo retorno ao 1 ato.

monte de beijos,
bena.