sexta-feira, 30 de março de 2007

Era só mais um dia qualquer e eu estava lá, na sala de espera da médica, enquanto imaginava o alívio instantâneo que seria me trancar numa geladeira.

E eu peguei uma dessas revistas nas quais o homem quer mostrar inteligência e acaba, nas entrelinhas, mostrando toda a sua falta de tudo. E enquanto ia me tornando mais niilista e entediada a cada página, vi aquela fotografia pequenininha no canto esquerdo.

Instantâneo foi o meu envolvimento.

O momento exato foi captado, o momento em que um homem de uns cinqüenta anos chorava como uma criança após ser verbalmente insultado por um político, simplesmente porque exerceu seu direito (e por que não prazer?) de discordar.

Sabe quando você sai na rua e tudo é movimentado e normal e bagunçado, até que alguma forma de vida merece sua atenção e, de repente, você se pega analisando cada detalhe ao redor dela e vendo a grandeza daquele pequeno pedaço de nada?

Era isso. A fotografia era um pedaço lírico de vida medíocre. Paralisada. E quando eu aproximava a página de mim, dava para ver as lágrimas se formando nos olhos dele, verdes. Na verdade eu não sei, mas eu gosto da idéia de seus olhos serem verdes. E mais que disso, eu gosto da idéia de alguém que sobreviveu a mais da metade da vida tendo alguma emoção para expressar por inteiro sem se desculpar.

Foi nisso que tenho pensado desde esse dia, na nossa fragilidade. Em como alguém que já sentiu quase toda intensidade de dor e perda se doou tanto para uma pessoa que também é um pedaço de nada, mas minúsculo, do tamanho de um quark.

Ficou claro para mim o que separa um recém-nascido de um adulto: a fragilidade do recém-nascido existe porque existe, e a fragilidade do adulto é cansaço.

Fiquei me perguntando se as coisas são como são por causa daquelas horas nas quais deveríamos ter nos calado e cuidado do próprio estado de alma, ao invés de nos deixarmos ser detestáveis. Quis apagar muitos dos meus diálogos.

Desejei que nunca me perguntassem mais nada, para que não me dessem tão de graça a chance de assassinar a auto-estima alheia. Desejei parar de achar e não acabar com o que eu não aniquilei quando não calei a boca. Desejei o máximo de silêncio possível o tempo todo.

O que me matou foi o fato de aquela fotografia estar ali, crua e intensa, e a reportagem só falar de quarks.

O que me matou mesmo foi o fato da minha fragilidade ser cansaço, quando sou mais recém-nascida que adulta.

Um comentário:

Otavio Cohen disse...

e de repente to tão distante de vc e a gente conversa ainda menos do que sempre. é o meu trabalho, é o seu estudo. mas ainda tem aquela conexão de sempre que não acaba de jeito nenhum. e falar de fragilidade é bem mais interessantes que falar de quarks (claro, eu faço humanas).

e tenha certeza que não é cansaço. é inexperiência. a gente ainda tem 10 e alguma coisa de idade... é cedo pra se cansar. (não que eu acredite nisso...)

bjobjo